Viés do Design brasileiro: José Zanine Caldas

Peça de José Zanine Caldas é reeditada pelo projeto Viés

José Zanine Caldas (Foto: divulgação)

José Zanine Caldas (Foto: divulgação)

Viés é o novo selo do mobiliário de luxo brasileiro. O projeto visa aliar as linguagens do design brasileiro, tanto atuais como as da década de 1950, para colocar no mercado peças que representem a brasilidade do país. Até aí o Blog AZ já falou bastante, mas vale lembrar que Zanini de Zanine, Ronald Scliar Sasson e Flavio Franco não estão apenas colocando sob o selo Viés suas peças, mas reeditaram também moveis de grandes nomes do design nacional.

José Zanine Caldas, pai de Zanini de Zanine, foi paisagista, maquetista, escultor, moveleiro e arquiteto autodidata. Deixou-nos em 2001 vítima de um enfarte aos 82 anos de idade, mas suas obras permanecem vivas. Foi da oficina de Zanine Caldas que saíam os protótipos de projetos assinados por nomes como Lúcio Costa, Oswaldo Arthur Bratke e Oscar Niemeyer. No final da década de 80, seu trabalho foi exposto no Museu do Louvre, em Paris, trazendo-lhe reconhecimento internacional.

Nascido em Belmonte, sul da Bahia, Zanine foi apaixonado, desde criança, por obras e serrarias. Aos 13 anos, ele começou a fazer presépios de Natal para os vizinhos usando caixas de seringa do pai, médico, feitas de papelão. Mais tarde, tomou aulas de desenho com um professor particular e, aos 18 anos, foi para São Paulo trabalhar como desenhista numa construtora. Dois anos depois, abriu firma própria no Rio de Janeiro para construção de maquetes.

O projeto Viés trouxe uma de suas obras em 2015. O Banco Belmonte é uma reedição de seu banco maciço produzido na década de 70 a partir de descartes do desmatamento da mata atlântica no sul da Bahia. Zanine era, desde cedo, preocupado com a questão ambiental. Seu principal objetivo era evitar a crescente destruição das florestas no país.

Banco Belmonte (Foto: Claudio Fonseca)

Banco Belmonte (Foto: Claudio Fonseca)

Viés do Design brasileiro: Ronald Scliar Sasson

Ronald Scliar Sasson é um dos nomes do novo selo Viés do design brasileiro

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Ronald Scliar Sasson nasceu em Curitiba, em 1967, e, como designer por formação, iniciou cedo o interesse pela marcenaria. O paranaense frequentava a fábrica de móveis da família e já namorava quando jovem a profissão que seguiria depois de adulto. Em 1985 foi morar por mais de um ano na Europa e Oriente médio, onde se ambientou com as novas formas de se pensar a estética do mobiliário.

“O design brasileiro começou com grande influência nórdica e a brasilidade veio com o tempo sem perder a alma e a influência da madeira”, afirmou o designer. A busca e o achado dessa brasilidade teve sua origem na década de 1950, por isso Ronald se uniu aos colegas de profissão Zanini de Zanine e Flavio Franco para desenvolver o Projeto Viés, uma aliança entre as linguagens dos tempos áureos do design brasileiro com o trabalho contemporâneo que vem sendo desenvolvendo pelos grandes nomes atuais do mobiliário nacional.

“Depois deste período dos anos 50, o design brasileiro visitou várias vertentes e buscou outras formas de amadurecimento, porém o design modernista voltou a ocupar seu lugar com ar contemporâneo na sua mais pura essência”, afirmou Ronald.“Acredito que o meu design é mais contemporâneo e industrial, porém, depois de iniciado este projeto, voltei a buscar minhas influências modernistas”, concluiu.

Para o lançamento de 2015, Ronald Scliar Sasson criou a Poltrona Boscoli, usinada em centro de cinco eixos. A Boscoli é um retorno do designer ao modernismo brasileiro e também uma referência à influência nórdica em suas criações. “Para o público, os consumidores e os amantes do design, a mensagem que fica é a confluência de valores e a projeção de linguagem mútua”, explicou Ronald.

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Fotos: Claudio Fonseca

Viés do design brasileiro: Flavio Franco

Flavio Franco é um dos criadores do Projeto Viés e lançou em 2015 o Banco Amy

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“O design brasileiro da década de 50 é o alicerce para o nosso atual”. Foi debruçado sobre este lema que o designer Flavio Franco se uniu ao carioca Zanini de Zanine e ao paranaense Ronald Scliar Sasson para, juntos, criarem um novo selo do design nacional. O projeto Viés entrou no mercado brasileiro com o objetivo de lançar, anualmente, peças de design mobiliário que unem a linguagem desenvolvida na década de 50 com aquela feita nos dias atuais.

Para Flavio, foi durante o período modernista que os materiais genuinamente brasileiros, como a madeira, o couro e as pedras, foram trabalhados à exaustação. “Ainda hoje essa época de ouro do design brasileiro serve de inspiração para vários profissionais, porém acho que devemos ter uma linguagem própria da nossa época, com traços autênticos do momento em que vivemos”, explicou o designer.

Flavio iniciou seu trabalho como arquiteto em 2000, ano que se formou pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Pernambuco. No final de 2012, lançou sua primeira linha de mobiliário, sendo convidado para as exposições “Do moderno ao contemporâneo – design brasileiro de móveis”, no Rio de Janeiro e em São Paulo, e Brasil S/A, em Milão.

Este ano, o projeto Viés já fez seu lançamento com peças dos criadores do selo bem como de Aida Boal e José Zanine Caldas. Flavio Franco desenvolveu uma estrutura em madeira e laminada em freijó. O Banco Amy é formado pelas interseções de vários planos com fixação oculta entre si, transmitindo um visual com equilíbrio e movimento.

O projeto Viés foi a oportunidade encontrada para unir dois tempos e duas linguagem a um só design. “Acho que pela primeira vez formou-se um grupo tão eclético, várias gerações estão envolvidas nesse projeto e, o melhor, com profissionais dos quatro cantos do país”, comemorou Flavio.

 

Flavio Franco - Banco Amy (Foto: Claudio Fonseca)

Flavio Franco – Banco Amy (Foto: Claudio Fonseca)

Flavio Franco - Banco Amy (Foto: Claudio Fonseca)

Flavio Franco – Banco Amy (Foto: Claudio Fonseca)

Viés do design brasileiro: Zanini de Zanine

Zanini de Zanine é um dos criadores do novo projeto de design que alia os traços modernistas ao desenho contemporâneo

Zanini de Zanine (Foto: divulgação)

Zanini de Zanine (Foto: divulgação)

Viés é uma trajetória ou direção oblíqua, segundo o dicionário. É uma linha ou segmento diagonal. No design, Viés é a união do design contemporâneo – inquieto e indiferente ao modismo e às práticas tecnológicas que apenas afastam o criador de sua criação – com aquele design modernista que, nas décadas de 1950 e 1960, impulsionaram a construção da linguagem do mobiliário nacional.

Unir esses dois tempos foi o desejo do trio que criou o projeto Viés, hoje um Selo do design nacional que se propõe a fazer o lançamento anual de peças do mobiliário brasileiro modernista e contemporâneo. Um desses nomes já é conhecido do Blog AZ, pois sua criatividade já foi pauta pra muita matéria nossa.

Zanini de Zanine nasceu no Rio de Janeiro e, ainda na infância, observava o trabalho do pai, José Zanine Caldas. Se o talento veio de berço ou de convivência paterna é difícil saber, sabemos apenas que Zanini de Zanine não poderia seguir outro caminho. Nomeado Designer do Ano pela Maison & Objet Americas 2015, Zanini de Zanine graduou-se em Desenho Industrial pela PUC-Rio em 2002 e, a partir de então, começou a produzir móveis em madeira maciça, com peças de demolição que batizou de “Carpintaria Contemporânea”.

Em 2005 começou a desenvolver peças produzidas industrialmente, deixando de escolher apenas a madeira como material para o seu design. Atualmente, o designer dirige o escritório de leva seu nome: Studio Zanini e á recebeu os mais importantes prêmios de Design do Brasil e fora pelos móveis que criou nos dois segmentos.

Juntamente com Ronald Scliar Sasson e Flavio Franco, está a frente do novo selo Viés, que está distribuindo pelo Brasil mobiliário criados por eles e por outros nomes tradicionais do design nacional. Nesta primeira coleção de 2015, Zanini de Zanine lançou a Poltrona Serfa.  “O que une o design de hoje ao criado nas décadas de 50 e 60 é o calor, o uso continuo da madeira”, explicou o designer sobre a relação da Serfa com o passado.

Para Zanini, o aspecto das peças dos anos 50 que estão sendo trazidas para as criações contemporâneas da Viés são a elegância e a delicadeza. “Com o Viés, vamos tentar apresentar uma linha de raciocínio, confrontar os trabalhos que têm brasilidade em diferentes momentos, como o Zanini Caldas, nos anos 50, e o Ronald Scliar Sasson e o Flavio Franco, na década de 90. Sempre reforçando o contraste de diferentes regiões dessa imensidão que é o Brasil”, concluiu.

Zanini de Zanine - Poltrona Serfa (Foto: Claudio Fonseca)

Zanini de Zanine – Poltrona Serfa (Foto: Claudio Fonseca)

O Viés do design brasileiro

Projeto reúne nomes contemporâneos e modernistas do criativo circuito de designers brasileiros para o lançamento de peças de mobiliário

 

Zanini de Zanine - Poltrona Serfa

Zanini de Zanine – Poltrona Serfa

O que o design modernista representa para o mobiliário nacional é um tema de tamanha importância que os designers Flavio Franco, de Teresina, Zanini de Zanine, do Rio de Janeiro, e Ronald Scliar Sasson, de Gramado, resolveram desenvolver um projeto com o objetivo de criar móveis de madeira assinados e catalogados anualmente que têm o modernismo como um de seus maiores traços.

Viés foi o nome escolhido pelo trio para batizar a coleção que explora dois lados de um mesmo design. De um deles estão as formas puras, criadas por ícones das décadas de 50 e 60 que contavam com os recursos nem sempre suficientes da indústria moveleira nacional, ainda em seus primeiros passos – como José Zanine Caldas e Aida Boal. Do outro, uma geração que poderia contar exclusivamente com tecnologia a serviço do móvel, mas que não abre mão da poesia.

Foi sobre este mesmo teto criativo que nasceu o projeto Viés, selo para venda de mobiliário assinado, catalogado e carregado de histórias. O Projeto Viés apresenta a sua primeira série de peças de premiados designers nacionais contemporâneos e importantes representantes da história do mobiliário modernista brasileiro. Uma edição de peças será produzida a cada ano por fábricas brasileiras para serem comercializadas nas lojas e galerias do Brasil, como a Armazém da Decoração.

O novo Selo Viés não poderia chegar ao Brasil sem fazer uma parada no Blog AZ, então durante esta semana vamos apresentar um pouco melhor o projeto por meio de seus designers… Aguardem!

Jose Zanine Caldas - Banco Belmonte

Jose Zanine Caldas – Banco Belmonte

Aida Boal - Poltrona Christina

Aida Boal – Poltrona Christina

Fotos: Claudio Fonseca

As plantas do Brasil

O design brasileiro ganha força com o projeto de João Paulo Florentino para o Jardim da Casa Cor 2015

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Moramos em um país onde o próprio nome se remete à vegetação, então para trazer a brasilidade para dentro de um jardim, o veterano de Casa Cor João Paulo Florentino apostou no que a flora brasileira tem de melhor. A aposta deu certo. Em sua terceira participação na mostra goiana, o arquiteto paisagista desenvolveu um ambiente simples, belo e muito acolhedor.

O jardim do Brasil possui 63 m² e foi inspirado na brasilidade do paisagismo nacional, revelado no início dos anos 1960 por Roberto Burle Marx e continua a ser descoberta a cada novo projeto, como no de João. Segundo o arquiteto, o jardim contemporâneo possui uma forte influência do paisagismo europeu, por isso trazer a brasilidade para o ambiente não foi tarefa fácil.

“Fizemos um passeio pelo estudo da vegetação brasileira até encontrar as plantas que trouxemos para a Casa esse ano”, contou João. A mistura da vegetação possibilitou que João recriasse um cenário natural no espaço reservado para o jardim esse ano. As cores, neutras, compuseram o ambiente para combinar com a vegetação e os móveis complementaram de forma harmoniosa a escolha cuidadosa de tudo que compôs o espaço.

O arquiteto explicou que o projeto debruçou em três linguagens distintas. A primeira delas foi a linguagem da vegetação, claro. As plantas de climas tropicais foram selecionadas com diferentes tipos de folhagem e colorações vibrantes. A cascata colocada num espelho d´água em uma das pontas do ambiente conseguiu ressaltar a exuberância de cada planta que compôs o jardim, recriando uma natureza aberta dentro de uma casa.

A segunda linguagem é a dos materiais e texturas em que a escolha de pisos e revestimentos foi norteada para imprimir características de rusticidade e heterogeneidade ao ambiente. Entretanto, foi a terceira linguagem que recebeu um toque AZ.

A terceira linguagem é a do mobiliário e iluminação, cujos materiais de fabricação refletem a homenagem do espaço à cultura brasileira. A Poltrona Astúria, de Carlos Motta, projetada em madeira de Itaúba com pés de balanço, é o toque final na força do design brasileiro dentro do ambiente de João Paulo Florentino.

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Texto: Bárbara Alves
Fotos: Marcus Camargo

“O design está se tornando algo complexo”

“Essa mistura de sensações que uma peça de mobiliário desperta é o que me encanta”

(Foto: Marcus Camargo)

(Foto: Marcus Camargo)

Foi em meio às batidas do som e o tilintar das taças de champanhe, em uma noite de Papo Design, que Fernando Mendes reservou tempo para um papo sobre design com nosso Blog AZ. O design faz parte da vida e inspira Fernando na hora de mergulhar nas possibilidades da forma e do encaixe da madeira. “Essa mistura de sensações que uma peça de mobiliário desperta é o que me encanta”, confessou.

Fernando descobriu quando era ainda jovem que seu ídolo do design era também seu primo. Unidos pelos laços familiares e pela paixão ao design, Sergio Rodrigues e Fernando Mendes trabalharam juntos por mais de 20 anos, parceria que se encerrou com a morte de Sérgio no fim do ano passado. Todas essas histórias foram relembradas na entrevista que o designer concedeu ao Blog AZ:

 

Quando você fala em design, sempre defende o trabalho de uma marcenaria de verdade, o que seria essa marcenaria?

Quando eu faço referência a essa marcenaria, me aludo ao uso das técnicas de marcenaria milenares por meio do encaixe na produção do design de móveis contemporâneo. A marcenaria é atenda a uma construção artesanal antiga ou nova, basta saber usar. A utilização do encaixe da madeira com o mínimo de intervenção de outros materiais, como o prego, é o que chamamos de uma marcenaria de verdade.

 

É possível usar essa marcenaria de verdade em um atelier de grande produção?

Sim, é possível desde que o atelier desenvolve uma série de mecanismos para poder produzir utilizando a marcenaria artesanal. Hoje, existe no mercado o CNC, comando digital para operar uma fresa, que cria o formado e faz o encaixe da madeira. A [máquina] CNC não é uma tecnologia nova, desde o início da década de 1930 os escandinavos já utilizavam esse mecanismo para fazer os encaixes da madeira de forma seriada para uma produção de maior escala. Quer dizer, os escandinavos já utilizavam esses gabaritos para produzir os móveis de forma muito sofisticada há mais de 70 anos atrás, produzindo peças extremamente elaboradas com um suporte fabril bastante tradicional. É uma tecnologia que não se utiliza uma interface digital e sim a inteligência.

 

Você costuma criticar a questão de o trabalho manufaturado ser relegado à segunda categoria. Essa desvalorização é uma tendência mundial ou é recorrente apenas no Brasil?

Acho que desconsiderar o trabalho artesanal e manufaturado ainda é uma tendência mundial, mas que está mudando. Ainda acho que aqui no Brasil é um pouco pior. Os brasileiros tem a cultura, herdada da colonização portuguesa, de acreditar que é preciso ter um nível universitário para se dar bem na vida e como a arte da manufatura é ligada a um setor mais técnico, a gente desprestigia. Em razão do preconceito, falta no mercado brasileiro pessoas com maior formação técnica e essa tendência acaba inclusive por atrapalha a nossa economia. É muito difícil contratar pessoas do setor técnico no mercado. Eu já tive um funcionário alemão com formação no setor técnico na Alemanha e ele achava estranho esse desprestígio. Seus amigos brasileiros, de nível universitário, não entendiam como um alemão que falava inglês não tinha uma formação superior, como se essa ausência deixasse o seu trabalho menos importante. As pessoas não compreendiam como ele estava se ‘sujeitando’ ao trabalho de marceneiro, como se fosse uma profissão que exigisse pouca inteligência – o que não é verdade. A marcenaria dá a oportunidade de a pessoa desenvolver trabalhos incríveis que exigem inteligência e muito estudo elaborado. É uma profissão que não fica a dever nada para nenhuma outra.

 

Algumas pessoas acreditam que o design mobiliário e o design de modo geral são uma espécie de arte, já outros a tratam como uma profissão. Qual é a sua opinião a respeito desse debate?

O design hoje em dia tem uma característica interessante de se tornar uma área de interesse que abriga um monte de inteligência. Ele surgiu como uma maneira de aliar forma, função, fabricação e emoção para despertar interesses e criar algo que tenha um lado artístico e outro funcional. Ou seja, deve unir a beleza da arte com a funcionalidade do produto comercial, pois não adianta criar algo belo que não possa ser levado para a fábrica ou ser de fácil produção fabril e não ter nenhuma beleza atrativa. O design hoje em dia está abraçando cada vez mais áreas, já que tem essa peculiaridade de ir agregando inteligências e interesses. Um cabeleireiro, por exemplo, se tornou um hair designer. O design está se tornando algo mais complexo.

 

Tanto seu trabalho como o de Sérgio Rodrigues são bastante modernistas. Como você abraçou esse tipo de criação e, junto com Sérgio, produziu peças bastante atemporais?

O design atemporal é aquele que cria objetos com uma expressão tão forte que passa pelo tempo e continua agradando, sendo interessante e atual. É o que chamamos de clássico. Claro que o clássico não nasce com essa característica, ele se torna clássico de acordo com o tempo e sua aceitação. Meu trabalho é muito ligado às décadas de 1950 e 1960 em razão do meu interesse por essa tecnologia escandinava da marcenaria de encaixes. Como os escandinavos ficam muito tempo dentro de casa, já que os países nórdicos são muito frios, eles se preocuparam em desenvolver peças atentas ao aconchego dos móveis e a uma beleza limpa, minimalista e sem muito rebuscamento. São móveis confortáveis, duráveis e gostosos de usar. Essa mistura de sensações que uma peça de mobiliário desperta é o que me encanta. Outro fator que despertou meu interesse foi o trabalho de marcenaria com o encanto da textura e dos cheiros. A marcenaria tradicional é uma atividade que mexe muito com os sentidos. Espero até um dia conseguir descolar disso, mas esse vínculo não é uma preocupação pra mim. Eu crio inspirado pelo trabalho da marcenaria e pelo fascínio de desenhar as peças à mão. Aprendi com o Sérgio [Rodrigues], que tinha uma paixão pelo desenho, a importância da criação inicialmente manual do trabalho moveleiro.

 

Dentro dessa criação mais tradicional ou industrial e da criação autoral, você acredita que podemos distinguir o bom do mau design?

Eu não sou um crítico de design, mas acredito que o bom design venha da sensibilidade de se gostar de criar e produzir. Existem coisas que são boas e outras que não; que têm uma estrutura equivocada para a sua fabricação ou uma estética sem inspiração, copiada ou sem conforto. O conforto não deve ser desprezado em nenhum momento. O design tem que abraçar a arte, o conforto, o saber fazer e a beleza do mobiliário.

 

Você fala muito na questão do encanto e de gostar do design e todos que falam em Sérgio Rodrigues lembram dessa mesma característica apaixonada que ele tinha de encarar o design. Como foi trabalhar com ele?

Depois de mais de 20 anos de convivência com Sérgio que percebi o que foi a maior influência dele na minha vida e no meu trabalho e essa influência foi exatamente essa paixão e emoção que ele teve com o ofício. O Sérgio batalhou em um momento que não existia um design brasileiro. Tinham poucas pessoas fazendo alguma coisa que expressasse uma cultura nacional dentro da fabricação de mobiliário e dos espaços institucionais. Ele começou a se dedicar ao mobiliário com uma crença e uma vontade tão forte de fazer acontecer que foi em frente atravessando bons e maus momentos sem nunca abandonar o entusiasmo.

 

Praticamente tudo que ele criou teve uma força grande e uma enorme repercussão no mundo do design.

Sim, e essa conquista veio da ligação que ele tinha com a emoção. Acho que ele queria tocar as pessoas com a sua criação. Sérgio foi um homem muito carismático, mas tinha essa coisa de atingir e provocar o outro. Seu é muito sedutor já tudo que ele criou foi feito para projetos específicos e pessoas específicas. Ele estudava o cenário da vida da pessoa e fazia um casamento entre o lugar e o sujeito criando peças perfeitas para cada ocasião. Ele conseguiu, ao mesmo tempo, ter uma variedade imensa de modelos que são distintos e uma linguagem única que é marca registrada do seu design. Ele conquistou umas coisas que acho muito difícil de serem alcançadas.

 

Seu trabalho foi muito importante para mostrar ao mundo que o Brasil tem design. Você acredita que ele foi um marco nessa questão da afirmação nacional dentro do design moveleiro mundial?

A motivação dele veio disso. Sérgio foi estudar a arquitetura e percebeu que na arquitetura de meados do século XX existiam varias representações da expressão brasileira. O Brasil já aparecia no cenário mundial da arquitetura, entretanto não tinha muito nomes no campo do mobiliário. Ele olhava para dentro dessa arquitetura e via somente o design europeu, já que não tinha uma identidade brasileira para colocar dentro das casas. O mote de Sérgio com o design foi o de justamente querer preencher esse espaço interno com algo que se comunicasse com a nossa cultura.

 

Design é meu mundo: Aparador Bianca

Sérgio Rodrigues deixou uma coleção de criações atemporais que podem ser encontradas no Armazém da Decoração

Bianca
Já dissemos aqui que o conceito de brasilidade está estampado na obra de Sérgio Rodrigues e não é mentira. O mestre do design trabalha com criações sofisticadas que deixam transparecer o estilo brasileiro de ser. Seu trabalho começou na arquitetura quando se formou em 1952 pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Entrou no design quando percebeu que arquitetura não pode se restringir apenas aos espaços externos e edifícios. Foi com esse interesse que Sérgio fundou a Indústria Oca em 1954, um dos estúdios de arquitetura de interiores e cenografia mais importantes do mobiliário brasileiro. Suas criações na Oca e após o fim da empresa somam cerca de 1.200 modelos de móveis.

Uma dessas peças, que é tema do nosso primeiro Design é Meu Mundo de 2015, é o Aparador Bianca. O desenho original da peça foi esboçado por Sergio Rodrigues em 1993 e relançado em 2005. O aparador tem estrutura em painel de madeira com encabeçamento e gavetas maciças. A peça pode ser encontrada em duas opções de tonalização. Pés torneados e puxadores em inox com acabamento acetinado fazem de Bianca um mobiliário atemporal.
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A influência do design nacional

Joaquim Tenreiro foi um dos grandes nomes do design mobiliário e influenciou muitos artistas com seus desenhos modernistas

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Conhecido como pioneiro do modernismo brasileiro, o marceneiro fez nome no design mobiliário nacional junto com Sérgio Rodrigues e Zanini de Zanine. Já sabe de quem estou falando? Sim, de Joaquim Tenreiro. Como muitos designers que influenciaram de forma considerável mobiliário brasileiro, Joaquim não nasceu no Brasil.

Exímio artesão de madeira, Tenreiro teve de onde puxar seu talento. Filho de marceneiro, o designer começou a brincar com as ferramentas do atelier de seu pai com o mesmo entusiasmo que seus colegas brincavam de carrinho e jogavam bola. Após ter vivido breves períodos no Brasil quando era ainda jovem, o português decidiu adotar o país como sua nova casa e a carpintaria como sua nova profissão.

No Rio de Janeiro, o tímido marceneiro se inscreveu em um curso de desenho mantido pelo Liceu Literário Português e, dois anos mais tarde, seria um dos membros mais ativos do recém fundado Núcleo Bernardelli. Nascia ali outra vertente de seu trabalho, a pintura. Além de carpinteiro e designer de móveis, Joaquim Tenreiro ficou conhecido também como projetista, pintor e escultor.
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No ramo mobiliário, sua primeira peça – respeitando bem o estilo moderno que conhecemos bem do mobiliário de Sérgio Rodrigues e Jorge Zalszupin – foi criada em 1942 para a residência do médico e colecionador Francisco Inácio Peixoto. Foi nesse momento que Tenreiro parou de produzir móveis para realmente projetá-los em seu estilo único.

O designer abandonou, no início dos anos 1940, as práticas recriar móveis em estilo clássico europeu. Na época trabalhava na Laubisch & Hirth, especializadas em fornecer peças imitativas dos velhos estilos franceses e italianos. Com o trabalho para Francisco Inácio, Tenreiro abandonou os clássicos, deu uma nova visão moderna ao mobiliário nacional e criou sua primeira peça autêntica.

O sucesso não era tudo e Joaquim decidiu, em 1967, entregar sua última encomenda de design – a decoração do salão de banquetes do Palácio Itamaraty em Brasília. Nesse período resolveu fechar oficina e lojas para, de então por diante, dedicar-se exclusivamente às artes plásticas.

Liberado de seu compromisso com o Desenho Industrial, Joaquim assinou grandes obras nas artes como o painel para a Sinagoga Templo Sidon na Tijuca, a portada da Capela Ecumênica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e os dois painéis em fibra de vidro realizados em 1975 para o novo auditório do SENAI na Tijuca.

O desejo de Joaquim Tenreiro em contribuindo com o design mobiliário morreu mais de 20 anos antes do artista, mas suas peças continuam vivas e inspirando novos e respeitados talentos do ramo mobiliário.

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Superlimão Studio

Quatro jovens arquitetos com criatividade e consciência ambiental criaram um escritório de design para lá de inusitado: o Superlimão Studio

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Sabe aquele velho ditado “uma imagem vale mais que mil palavras”? Ele se aplica bem ao trabalho do coletivo Superlimão, já que nenhuma palavra dessa matéria descreverá com tanta precisão o talento desse time de jovens designers. Inusitado é a primeira palavra que passa na cabeça de quem conhece de perto o design do dos “superlimões”. Irreverente, lúdico, criativo são as próximas da fila.

Em 2002 Sergio Cabral, 33, formado em desenho industrial pela Faap, montou o escritório com o amigo Thiago Rodrigues, 31, que estudou arquitetura na mesma faculdade. Em 2009, Lula Gouveia, 31, engenheiro e arquiteto formado pelo Mackenzie e Antonio Carlos Figueira, 27, que cursou turismo e trabalhou com questões ambientais, se uniram ao grupo. Juntos tinham todos os ingredientes necessários para colocar no mercado o Superlimão: criatividade, conhecimento e responsabilidade ambiental.

O Superlimão Studio atua no campo de design de mobiliário e com arquitetura residencial e comercial. Com uma formação tão heterogênea, Sergio, Thiago, Lula e Carlos acabaram se capacitando para atuar em todas as vertentes do design e em todas elas imprimem sua marca de irreverência. “Fazemos o produto completo, desde o mobiliário até a engenharia”, explica Sergio.

O nome nasceu do velho dito fazer de um limão uma limonada. Quem vê o trabalho do grupo imagina que toda aquela criatividade deve sair uma fortuna, mas o Superlimão aproveita os materiais que já estão no imóvel antes de uma reforma, assim os curtos da obra ficam menores. Ponto para o reaproveitamento sustentável!!

E já que tocamos no assunto sustentabilidade, Sérgio explica: “O tema sustentabilidade virou palhaçada. Muitas vezes gasta-se tanta energia para levar um piso ecológico para Ubatuba que seria melhor usar uma pedra de lá”. Para o grupo, sustentabilidade nem sempre se concentra no material usado, mas sim no aproveitamento do que já existe, afinal facilitar é a forma mais simples de economizar.

A busca por novas linguagens estéticas casou perfeitamente com o padrão de sustentabilidade adotado pelo Studio. O grupo acaba encontrando em materiais inusitados, reciclados, a saída para criar uma peça de mobiliário ou uma parede sem gastar e desgastar o meio ambiente. Em seus projetos comerciais, o Superlimão Studio já reformou e repaginou restaurantes e lojas das capitais brasileiras. Em um de seus trabalhos recentes, o coletivo criou a identidade física de uma loja tão criativa quanto seu trabalho: a Carbono Design de Marcus Ferreira.

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